• Depois do VR, VA, VT chegou a hora do VN – o Vale Networking


    Para funcionar bem no mundo profissional, seja trabalhando em uma organização, seja empreendendo no seu próprio negócio, a gente precisa de competências técnicas, competências comportamentais e de uma rede de relacionamentos.

    Competência técnica é o que garante que a gente sabe fazer alguma coisa, tem capacidade de entregar um trabalho. Em algumas atividades ela é óbvia: o cozinheiro, o mestre de obras, a médica, o piloto de avião, a condutora do metrô, a advogada tributarista. Em outras atividades o conhecimento técnico é diferencial – a gestora de um pequeno negócio que sabe um pouco de administração e fluxo de caixa; o motorista de táxi que fala uma língua estrangeira; a técnica esportiva que tem uma boa formação em psicologia; o arquiteto que é um tremendo artista plástico. É para conquistar e aprimorar essas competências técnicas que a gente estuda, lê, faz cursos, tira diplomas e pendura na parede. Sem nenhuma competência técnica é difícil seguir qualquer carreira ou empreender – só sobra mesmo o big brother.

    Como hoje em dia todos os trabalhos são feitos em equipe, competências comportamentais viraram uma necessidade. No livro “Potencial Oculto” o psicólogo organizacional e autor consagrado Adam Grant defende que essas competências – antes chamadas de “soft skills” – passaram a ser mais importantes que as competências técnicas. Ele sustenta essa tese polêmica com montanhas de dados.  É verdade que procurando direitinho se acha dado para justificar tudo… Mas parece indiscutível que cada vez mais precisamos de outras pessoas para completar qualquer atividade, então quem não sabe lidar com pessoas não consegue entregar nada. O nerd da tecnologia, que ficava num canto e se pedia para ninguém falar com ele para não atrapalhar – hoje ele trabalha numa equipe. Ou ele sabe ouvir de maneira generosa, se colocar de forma respeitosa, conviver com quem é diferente… ou ele não vai pra frente.

    Acontece que mesmo quando temos as competências técnicas adequadas para exercer uma determinada função, e uma capacidade razoável de trabalhar em equipe, sem ajuda a gente não sai do lugar. É difícil encontrar uma pessoa que se considera bem-sucedida batendo no peito e dizendo: “Consegui tudo sozinho, nenhum filho da mãe me ajudou!”. Uma música antiga do Gonzaguinha ensinava: “Eu aprendi que se depende sempre, de tanta muita diferente gente…”.

    O relacionamento profissional mais básico, mais simples, que existe, é o colega, a colega de escritório. Não só companheiros da mesma seção, do mesmo departamento, mas também a chefia – direta e indireta – e a galera das outras áreas que a gente acaba tropeçando no dia a dia. Pode ser por necessidade profissional – quando a gente precisa que a tecnologia adiante um ticket que é urgente, que o RH dê atenção a uma vaga em aberto que precisamos preencher pra ontem, que o financeiro acelere a emissão daquela nota, que o marketing agilize a organização daquele evento. Mas, principalmente, trombando por acaso – falando sobre a novela no elevador, resenhando o resultado do futebol no bebedouro, sentando na mesma mesa no quilo da esquina, comentado os benefícios do queijo da serra da canastra quando o tiozinho das delícias mineiras monta aquela mesa de pecados. Aliás, descobri outro dia que a quinta-feira é a nova sexta – como em geral se deixa a sexta para home office, o happy hour agora é na quinta.

    Infelizmente muitas empresas hoje não oferecem esse benefício básico – um espaço para que profissionais (especialmente jovens) comecem sua rede de relacionamentos. Claro que a enorme maioria dos trabalhos em empresas de serviços podem ser feitos à distância. E se o escritório não fosse o lugar de realizar uma tarefa? Na primeira vez que visitei uma loja Apple me espantei quando o funcionário falou sobre os benefícios de comprar aquele produto na internet e não na loja – demorei para entender que a loja da Apple não servia para vender.   

    A organização que tiver um espaço onde as pessoas vão se encontrar, realizar atividades em conjunto, fazer massagem, fazer cursos… e nas horas vagas discutir temas sensíveis, fazer sessões de feedback, grudar post-it na parede para brainstorming, pensar planejamentos de longo prazo e até entregar um pouco de trabalho… Essa empresa vai ter um diferencial enorme.

    De alguma forma isso já está acontecendo. É sabido que estudantes que buscam estágio preferem os que oferecem uma experiência presencial intensa. E não é só porque se aprende mais quando se está ao lado de quem sabe – essa galera jovem está de olho no potencial de networking. Não parece distante o momento em que candidatos vão perguntar sobre o plano de saúde, o gympass, o vale refeição, o vale alimentação, o vale transporte… e o vale networking.

    Como seria um vale networking atraente? Meu pitaco: menos que 3 x por semana no escritório nem adianta dizer que tem o benefício, é enganação. Se nunca está todo mundo junto também enfraquece a oferta – em se tratando de networking, quanto mais oportunidades, melhor. Quando estamos no mesmo espaço as pessoas estão olhando para o computador – bom, assim é melhor mandar a galera pra casa. Um bom vale networking portanto é composto de bastante gente realizando atividades em conjunto bastante tempo. Nesse contexto, a empresa 100% home office não consegue oferecer um vale networking atraente e portanto não disputa talentos mais ambiciosos. Porque até os estagiários já sabem que networking e sucesso profissional são duas coisas totalmente ligadas.

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