As empresas que trabalham com um fixo baixo para a equipe de vendas se baseiam no argumento de que estão incentivando o “instinto animal”. Imaginam o time correndo desenfreadamente atrás do pote de ouro, aquela energia e adrenalina muito louca, os negócios entrando e todo mundo andando de carrão importado e acendendo charuto com nota de cem dólares. Na parede aquele cartaz: “Eu prefiro segurar do que empurrar”. Pode até ser verdade na teoria, mas na prática não funciona. Uma pesquisa realizada em vários países e publicada em 2005 mostrou que incentivos financeiros ajudam a melhorar os resultados até certo ponto; quando o variável é grande demais frente ao fixo a pressão aumenta muito e a galera corre pra cá e pra lá que nem loucos, mas a produtividade, na verdade, cai. (*). 

Podemos adicionar mais alguns dados. Para começar, ninguém oferece variável polpudo para venda fácil. Então a venda é complicada – a empresa ou o produto são novos, o processo é demorado, tem um monte de concorrentes… e a pessoa de vendas que tem um fixo baixo logo desanima e cai fora. Mesmo que, a médio prazo, essa mesma pessoa pudesse performar. Segundo porque um talento excepcional, que consegue fazer girar um produto difícil, rapidinho chama a atenção, as propostas começam a pipocar e uma delas acaba sendo melhor que aquela que tem uma pressão absurda. Ou seja, a empresa perde quem não vende, e perde quem vende também.

Empresas que oferecem fixo alto têm mais facilidade para atrair e reter talentos, e com isso constróem equipes mais consistentes. Inimigos desse modelo apontam para o risco da acomodação. É verdade que a gestão tem que ser mais ativa, para acompanhar a equipe muito de perto e identificar rapidamente quem está patinando e agir de forma enérgica, inclusive desligando se for o caso. Fixo alto não combina com gestão ausente. Mas na soma total esse é o modelo vencedor.

Em geral quem oferece fixo baixo é porque não não tem alternativa. Mas então essa empresa nunca vai poder competir no mercado? Como uma operação nova cresce, se logo de saída tem que montar uma equipe cara? Algumas sugestões:

1. Apostar em pessoas ainda em fase de formação, para quem o fixo, ainda que baixo na média do mercado, é atraente. O investimento em treinamento e supervisão vai ser alto, e o turnover também (nem todo mundo é treinável…). Mas ainda assim é mais barato que trazer uma equipe experiente a peso de ouro.

2. Garantir o variável naquele período inicial de evangelização que a venda não acontece. Se a comissão é boa mesmo, depois de algum tempo a pessoa pensa salário como fixo + variável e fica menos sucetível a aceitar propostas da concorrência – e com o negócio girando, sempre se pode aumentar o fixo e equilibrar melhor essa conta. Esse modelo não é tão popular por erros dos dois lados: as empresas que não conseguem oferecer um fixo alto em geral querem resultado imediato; e o modelo atrai oportunistas interessados apenas naqueles meses de variável garantido. 

3. Existem exemplos de empresas estabelecidas no mercado com fixo baixo e variável alto. Nesse caso a melhor propaganda do modelo é a própria equipe que está lá e atesta que o produto vende bem e na soma fixo + variável a conta fecha. E, principalmente, que o variável alto é efetivamente pago. Sim, porque um caso infelizmente muito comum é que o variável alto só é bom quando não tem ninguém vendendo muito. Basta começar a dar certo que a empresa quer rever. Muita gente já caiu nessa e hoje não quer saber desse modelo nem pintado de rosa Barbie.

(*) “Large Stakes and Big Mistakes”, Dan Ariely, Uri Gneezy, George Loewenstein, and Nina Mazar, Research for Behaviour Economics and Decision Making, Federal Reserve Bank of Boston